Voando livremente
na garupa de um cavalo de vento,
galopando além de um mundo
envolto em fumo e nevoeiro,
além do último firmamento,
fugindo do respirar profundo
da terra que te escorre.
Um poeta nasce para a luz
radiante e quente
do sol feito criança,
numa manhã intocável
para carne de gente.
Um poeta que é homem e deus
num súbito duelo de almas iguais.
Que floresce nalgum jardim
perdido a olhos de mortais.
Que faz rugir as águas sem fim
de um mar secreto e fundo
e rebentar as caldeiras
de fogo, dos pulmões do mundo...
Um poeta que se alimenta
do perfume do ar e na beleza
que toma acalma a sua sede de amar.
Criatura despida de pudor
e pele tresandando amor.
Olhos banhados por lágrimas
de um mendigo,
que vagueia solitário
por ruas do Inferno
escondido na noite,
à procura de quem amou,
ao gelo, à chuva, ao frio,
aquecido por um coração de fera
que um dia se tornou
carne e sangue
e em carne e sangue se entregou
à Vontade de Ser Poeta.
No seu trono de nuvens
numa Lua de sonhos,
olha os bichos do Mundo
prostrados no chão.
Olha a Terra cansada
da eterna mesquinhez
de uma guerra e de uma paz.
Chora e berra e grita,
no silêncio da madrugada,
por um pouco de loucura,
por um bocado de Nada.
Liberta as asas leves
do teu pensamento.
Solta as rédeas
da tua alma nua,
quando, esvoaçante, o vento
te murmurar ao ouvido:
És Poeta.
És filho da condição humana.
Toma o caminho de santiago,
cavalga além das estrelas.
E no buraco mais fundo
da Terra sedenta de sentido,
num momento
de sensata insanidade,
revela ao Mundo
por que nasceu a Humanidade:
para ser Poema.
enquanto me ocupo de barbas e vestidos azuis, aparições e mortes vermelhas, aqui vão caindo poemas já com amizades aracnídeas (para quem não é 1/4 de entendedor, poemas antigos)
micas, micas... :) ta muito forte o poema, acho que é a palavra certa, se bem, que isto deixou-me um pouco sem adjectivos..
eu vi neste poema, o poeta que atinge o auge do tudo, com sensibilidade divina e que à noite não deixa de se "deitar" com os homens, como homem que ele próprio é, e nao ousa deixar de ser. o poeta que encontra essa divindade no que de mais cru existe, o poeta que redescobre a Vida na forma que Ela nunca devia ter perdido.. o poeta... aquele que escancara a alma, sem medo de ventanias..
Belo, lindo, intrasingente, puro, afiado como o diamante arrancado às entranhas de Gaia. Afiado como um bisturi que se encosta na carótida pulsante do líquido que nos faz. Temos poetisa.
E adorei a referência ao caminho de San'Tiago.
Já para não falar do 1/4...