sexta-feira, abril 15, 2005

O Pescador Lusitano

O suave e dourado sol da tarde
em teu colo suavemente repousou,
enquanto teus olhos de todas as cores
em eterno azul se fundiram,
em lágrimas jorradas por amores
que te abandonando a alma sozinha,
em urros suplicantes se perderam,
nos confins do teu corpo de menina.

Teus cabelos doirados refulgem
à luz de um ostentante sol já cansado
de te estender seus braços ofuscantes,
a delirar,
de passar o tormentode só se poder prolongar
numa leve e fugidiailusão de uma carícia,
de tentar ter-te em vão,
enquanto o seu desejo te enche ainda mais de luz
e lhe arranca de ainda mais fundo a paixão.

A brisa de um ocaso adormecido
revolve teus cabelos finos
e ondula-os numa dança secreta de outras eras.
Um qualquer lugar esquecido,
para além do horizonte deste mundo,
foi teu berço, teu abraço,tua mãe, teu regaço,
de flores sem perfume inundado.
Eu sei. Tuas mãos dizem-me.

As mesmas mãos brancas e trémulas
que são teu único alentonas horas de solidão.
Que te envolvem enquanto choras,
que recolhem teu corpo nu,
encolhido numa palma de mão.
Que te afagam o rosto invadido
pelas enchentes de lágrimas
nos intervalos de cada soluço apagado.

E tu choras sempre,
não te dá o cansaço, a fadiga.
Choras quando ris,
por haver quem chore por ti,
choras quando um amante te morre
e mata de amor,
choras pelo sofrimentode não ter porque chorar,
choras por não saberque fazer ao calor
que te agita as entranhas até à loucura,
choras antes por não ter como parar.
És assim feita de lágrimas por dentro
e delas sacias fome e sede.

E como é lindo o teu corpo de mulher!
como, quando te vejo nua,
pareces vestida de beleza!
Tua pele bronzeada pela Lua,
esconde mil reflexos de arco-íris
e espelha tua própria alma.
O dia envolve-se no reino nocturno,
o céu enche-sede ténues nuances lilases,
azuis, amarelas e vermelhas.
Mas a tua tristeza é cinzenta,
como a noite iluminada...
Não há nuvens que te cubram
a nudez desamparada.
Não há vestidos de princesa,
nem jóias de sultões
que te possam servir.
Mas para a minha alma solitária
basta ver-te a sorrir,
surges esplêndida aos meus olhos!...

Basta isso, somente,
para que meu coração se encha de ardor
e minha alma se sinta vazia...
E me sinto só, completamente
e sinto frio, por não me envolver o calor
da tua tão sôfrega companhia.

O Sol já se pôs,
já nem me lembro dele.
E repousas no teu leito,
ao relento.
Tua boca são de rosas que não existem.
Teus seios um abismo de mim sedento,
teu ventre de promontórios derrubados.

A Lua sobe linda no céu,
vestida de diamantes em bruto,
enche-te os sonho de pesadelos,
cobre a noite de luto
e desafia a tua sobre-humana beleza.

Mas tu és mais linda.
Porque eu te amo,
porque eu sem ti não tenho mais nada,
porque eu sem um beijo teu
fico pobre e faminto,
porque me deixo embalar nos teus braços.
Minha alma torna-se pura
por nas tuas lágrimas se afogar.
Minhas mãos e as tuas
se prendem em laços de fogo e aço,
para não me poder jamais de ti separar.

Meus olhos pedem a tua íris de sete cores,
a minha boca pede a tua...
mas o teu amor chega em vagas,
em hesitantes marés de fulgores,
em desesperados gritos de gaivotas.
Teus abraços são fugazes...

E eu olho-te, linda, a dormir.
Minha paixão vê-te anjo,
mas sei que este amor terá um fim.
Um dia, num leito de amor,
tornas-te besta.
(como fizeste a outros antes de mim...)
Meus olhos vêem-te branda,
mas sei que és também diabo,
cruel e fera.

Tua fúria, teu amor,
meu fim sinistro:
por ti adentro hei de morrer.
Mas não desisto!
Sem teus olhos morro de pior maleita,
sem teu olhar condeno-me a sofrer.
Engoles-me e somente aí
me torno amor eterno para ti.
Choras, chorarás por mim.
Mas não vou fugir.

Minha pátria inteira
está dentro de mim,
enquanto te olho a dormir.
Comigo se entrega à morte,
só por te amar.
Somos um só nesta loucura.
Já só te ouço o respirar,
o marulhar das tuas ondas,
o teu cheiro a maresia.
Tomo fôlego e mergulho em ti,
Mar
da minha lusitana terra.



(a imagem não é muito lusitana, mas aqui fica uma homenagem a esse grande Hokusai e ao seu amor pelas ondas)


Este jé tem uns dois anos e algumas "falhas", talvez seja melhor chamá-las de características, tiques, mto próprias dessa altura. Um dia talvez as tente suavizar. Ou não. Mas por enquanto fica a ideia, a vontade e a paixão.

1 Indiscrições:

Anonymous Anónimo cuspiu...

Ideia
Vontade
Paixão

E saudade, daquela extremada que bate no peito lusitano!

Excelente! Se este poema tem «falhas» nem quero pensar como sairia hoje em dia. Vertes energia sob a forma de palavras. Adorei e aguardo mais.

abril 15, 2005 7:46 da tarde  

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